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Apontamentos da Nossa História | Médico de Partido Municipal – séculos XIX – XX

Apontamentos da Nossa História | Médico de Partido Municipal – séculos XIX – XX
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16 Novembro 2023

“Médico de Partido Municipal”, também designado por “Médico Facultativo”. O que consistirá? Qual a razão deste apontamento?

Ao conhecermos um documento emitido pela Câmara Municipal do Concelho de Paredes, designado por Alvará de nomeação do cargo de Médico de Partido Municipal, datado de 1900, levou-nos a encetar uma breve pesquisa, no sentido de compreendermos do que realmente se tratava, uma vez que o assunto não nos era familiar.

Efetivamente, como a assistência médica fora dos grandes centros urbanos era muito parca, uma das formas de minimizar esta carência era prestada pelas Câmaras Municipais, disponibilizando aos doentes e pobres, serviços médicos gratuitos, através de um contrato com médicos, boticários e outros.

Esta prática tornou-se mais consistente com a criação das Escolas Régias de Cirurgia do Porto e Lisboa e mais tarde, em 1836, com a criação das Escolas Médico-Cirúrgicas, em Lisboa e Porto. Porém, só em 1842 é que o Código Administrativo Português refere os Partidos Médicos Municipais, limitando-se, contudo, a autorizar a contratação, mas sem ser obrigatório. Em 1886, O Código Administrativo Português passa a determinar as competências e obrigações de Partido. Com a criação da Direção Geral de Saúde e Beneficência Pública, passa a regular a obrigatoriedade de as Câmara Municipais terem pelo menos um médico facultativo de partido, bem como outras obrigatoriedades, entre as quais, as de articular com os subdelegados para o melhor desempenho da Saúde Pública, conforme explanado no decreto de 24 de dezembro de 1901 (Costa, 1901). Contudo, é sempre advertido que os partidos não poderão ser criados exclusivamente para medicina ou cirurgia.

Porquê Médico de Partido? António de Morais Silva (1954, p. 618) define Médico-de-Partido “Aquele que recebe estipêndio por trabalho determinado. Designação vulgar do médico que é remunerado pelos municípios, para assistência clínica aos pobres, serviços de higiene e profilaxia, etc”.

As Câmaras Municipais deviam de ter pelo menos um médico facultativo e ao criarem o partido, tinha que ser definida a área geográfica dentro da qual o facultativo iria prestar os serviços médicos, bem como, obrigatoriamente, de aí residir (CA,1886, Art.168). A existência de mais do que um partido, dependia de médicos disponíveis e do poder económico das Câmaras Municipais, uma vez que os médicos ao serem contratados auferiam um vencimento definido em tabela pelo próprio Município.

Os Médicos de Partido Municipal eram providos em concurso aberto e, conforme estipulado no Código Administrativo (1886, 1894), incumbia-lhes obrigatoriamente e de modo gratuito: curar os pobres, os expostos, crianças desvalidas e abandonadas e os presos; vacinar sem distinção de classes, inspecionar as meretrizes nos dispensários; coadjuvar profissionalmente a autoridade administrativa ou policial, fazendo exames e diligências sanitárias.

Os Facultativos não podiam, ainda, sair para fora do concelho por mais de três dias, sem licença da Câmara e havendo só um, deveria ser substituído. Não podia despedir-se sem aviso por escrito, com dois meses de antecedência. Por sua vez, as Câmaras Municipais, também, não podiam alterar os vencimentos e as vantagens com que foram providos, nem extinguirem os partidos sem que os facultativos fossem previamente ouvidos. Os partidos, também, não poderiam ser criados exclusivamente para medicina ou para cirurgia e os concursos não deveriam ser abertos só para determinadas Escolas, mas para todos os que estivessem legalmente habilitados.

No caso concreto e com base no documento que gerou o impulso a este apontamento, verifica-se que, a Câmara Municipal de Paredes emitiu um alvará de nomeação do Dr. Casimiro Lemos Coelho Ferraz, em sessão de 11 de abril de 1900 (Livro Atas C.M.P. nº 23, p.134-134v), para o cargo de Médico de Partido Municipal, cujo ordenado anual é de 300 mil reis, ficando sujeito a todas as obrigações especificadas no acórdão da sua nomeação e responsável pelo cumprimento de todas as ordens, que por deliberação camarária lhe forem transmitidas e, ainda, obrigado ao pagamento de direitos de mercê.

De acordo com a sessão da Câmara de 3 de Janeiro de 1900 (Livro Atas C.M.P. nº 23, p.113v-114), depreende-se que havia a intenção da Câmara de Paredes criar um segundo Partido, pelo que após leitura do ofício do Governador Civil, que comunicava que o Governo de Sua Majestade não podia aprovar essa intenção, sem que fosse ouvido o Médico de Partido já criado (aliás como era determinado por lei), consideraram que o médico do partido existente, Dr. José Rodrigues Moreira já havia sido consultado e “…se manifestou com todo o enthusiasmo a favor da creação bem como delimitar a área ao segundo …”. A Câmara Municipal de Paredes decidiu delimitar a respetiva circunscrição geográfica, constituída pelas freguesias de Gandra, Astromil, Vandoma, Baltar, Vila Cova de Carros, Cristelo, Sobrosa, Duas igrejas, Vilela, Lordelo, Rebordosa e em Mouriz, os povos da margem direita do ribeiro do Forno.

A 11 de abril de 1900 (Livro Atas C.M.P. nº 23, p.134-134v), após terem sido examinados os documentos que constituíam o requerimento, enquanto médico cirurgião, e verificando-se todos como reconhecidos e autênticos, foi nomeado por unanimidade. A Câmara teceu considerandos elogiosos como “… se acha habilitado exhuberantemente para exercer o referido logar…” e também “…por ter exercido a sua clínica com distinção…”. A certidão passada pela Escola Médico-cirúrgica do Porto confirma, efetivamente, que Casimiro de Lemos Coelho Ferraz, natural e residente na freguesia de Mouriz, concelho de Paredes, no dia 18 de Junho de 1879, “… fez o Acto grande, e ficou aprovado plenamente.”

No concelho de Paredes e porque não fizemos uma pesquisa exaustiva, não sabemos ao certo quando iniciaram os Médicos de Partido. Porém, a resposta dada ao requerimento do Dr. Casimiro à Câmara Municipal de Paredes, a solicitar a indicação de quantos facultativos existiam no ativo, ficamos a saber que havia o Dr. José Rodrigues Moreira, nomeado a 25 de Fevereiro de 1892, o próprio Casimiro de Lemos Coelho Ferraz, nomeado a 11 de abril de 1900 e como aposentado José Bernardo Ferreira Pinto da Cunha, por deliberação de 1 de outubro de 1891.

A figura de Médico de Partido Municipal ou facultativo continuou, conforme assegura o extraordinário livro, Cadastro dos Funcionários, quer pelos registos que contém, quer pelas suas dimensões, aonde estão as fichas individuais dos funcionários municipais de Paredes, com fotografia associada. Neste livro encontramos as fichas dos Médicos de Partido, para um período de seis décadas, nomeadamente a do Dr. Augusto Ferreira da Cunha Leal, residente na Vila de Paredes, nomeado a 14 de Janeiro de 1916 para Médico Municipal do 1º partido, exercendo até 1944, tendo sido, também, Delegado de Saúde do concelho; a do Dr. José Mendes Moreira, residente na Vila de Paredes, nomeado em 5 de agosto de 1935 para médico municipal do 2º partido, exercendo até 1960, (tendo sido, também, Director Clínico do Hospital da Misericórdia de Paredes, provido em 12 de maio de 1936); a do Dr. António Martins da Costa Rangel, residente em Rebordosa, nomeado a 3 de maio de 1935 para médico do 3º Partido, com funções até 1960; a do Dr. José Alves Leão, residente em Chãos – Parada, nomeado a 28 de março de 1935 para médico do 4º partido, exercendo funções , também, até 1960 e a do Dr. António Augusto Macedo Malheiro, residente em Bitarães, nomeado a 16 de Maio de 1941, para médico do 2º partido, com funções até 1953. Este médico havia exercido a mesma atividade de 1927 a 1941, no Município de Tabuaço.

Assim, aqui fica um breve apontamento sobre o importante papel que as Câmaras Municipais, e neste caso a de Paredes, tiveram nos seus territórios, no que respeita ao acesso aos cuidados de saúde para os mais desfavorecidos, lidando com questões sanitárias, epidemias e cuidados básicos, através dos Médicos de Partido Municipal, assim como, no precedente para o desenvolvimento do sistema de saúde pública.

Novembro de 2023

Antónia Silva

 

 

BIBLIOGRAFIA

Código Administrativo (1942). Lisboa: Imprensa Nacional, p. 32.

Código Administrativo Portuguêz (1854). Anotado. 18 de março de 1842. Lisboa: Imprensa Nacional.

Código Administrativo Portuguêz (1892). Decreto de 17 de Julho de 1886. 2ª edição. Coimbra: Imprensa da Universidade.

Código Administrativo (1895). Decreto de 2 de Março de 1894. Porto: Livraria Portuense Editora.

COELHO, José Abílio (2012) - Os “Partidos Médicos” e os cuidados de saúde prestados aos doentes pobres nos municípios portugueses. Disponível em https://quiosquedaruadafeira.blogspot.com/2012/12/os-partidos-medicos-e-os-cuidados-de.html (consultado em 11-11-2023)

COSTA, Diogo Alcoforado da (1901) – Decreto de 24 de Dezembro de 1901 que aprova o Regulamento Geral dos Serviços de saúde e Beneficência Pública. In A legislação. Publicação Mensal. Porto: Typ.de A.F. Vasconcellos, Successores. Dezembro, p.958-1010.

REBELLO, João M. Pacheco Teixeira (1900) - decreto de 21 de Junho de 1900 que aprova o Código administrativo. in A legislação. Publicação Mensal. Porto: Typ.de A. F. Vasconcellos, Successores. Junho, p.140-141

SILVA, António de Morais (1954) - Grande Enciclopédia da Língua Portuguesa. 10ª edição revista, corrigida muito aumentada e atualizada segundo as regras do acordo ortográfico Luso-Brasileiro de 10 de Agosto de 1945. Vol. VI. Editorial Confluência.

FONTES DOCUMENTAIS

Arquivo Municipal de Paredes - Livro Atas câmara Municipal de Paredes, nº 23, p.113v-114

Arquivo Municipal de Paredes - Livro Atas câmara Municipal de Paredes, nº 23, p.134-134v

Arquivo Municipal de Paredes - Camara Municipal de Parêdes. Cadastro dos Funcionários. Direção Geral da administração Politica e Civil. Modelo nº 639 do catálogo – Diversos (exclusivo da Imprensa Nacional de lisboa).

Camara Municipal de Parêdes (1900) Alvará de nomeação do cargo de Médico de Partido Municipal (Documento particular)

Certidão quanto aos médicos municipais ativos. 16 de setembro de 1900 (Documento particular)

Certidão de habilitação passado pela Escola Médico-cirúrgica. 15 de Março de 1900. (Documento particular)

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