Passar para o Conteúdo Principal

município

logo Paredes

videopromocional

siga-nos Facebook Instagram RSS feed

Apontamentos da Nossa História | Faustino Coelho Moreira: Achegas sobre um percurso pouco conhecido do Visconde de Rebordosa

Apontamentos da Nossa História | Faustino Coelho Moreira: Achegas sobre um percurso pouco conheci...
20 Abril 2024

Existem acasos que julgamos serem apenas acasos estando eu longe de imaginar que algo decorreria desse improviso furtuito, muito menos que se traduziria no presente texto destes apontamentos da nossa história. No ano transato um colega da área descobriu no Arquivo Municipal de Resende um documento referente a um requerimento para o encanamento de águas feito à Câmara Municipal de Paredes por um tal de Faustino Coelho Moreira que assinava como Visconde de Rebordosa. Se o desconhecimento sobre a causa do aparecimento de tal documento em Resende é um mistério por resolver a curiosidade que me despertou a personalidade foi outro enigma com que me deparei e que me apraz tentar resolver.

Apesar de existirem algumas notas sobre o Visconde de Rebordosa como a de Gomes de Sousa no Paredense ou, por exemplo, as referências na Monografia de Rebordosa, subsiste ainda uma grande dose de desconhecimento sobre o seu percurso. Conhecem-se alguns dados biográficos, a carta de atribuição de título e poucos mais apontamentos que foram acrescentados (alguns com imprecisões). Pretendemos aqui, até porque percebemos durante a pesquisa que parte desta lacuna de informações radica na dificuldade de se colherem informações e fontes, trazer novos dados e um pouco mais de destaque sobre uma personalidade com notoriedade social e económica durante o percurso de vida, em grande parte feito no concelho de Paredes.

No projeto lei da Assembleia da República relativo à elevação da freguesia de Gandra à categoria de cidade é referido como justificação de caráter histórica o facto do Visconde de Rebordosa ter aí nascido na casa das Fontainhas, também conhecida casa do Comendador. Ora que existe uma ascendência deste que radica no lugar das Fontainhas, pelo menos desde o seu bisavô Manuel Coelho Moreira, que, quando seguimos os registos paroquiais, é o primeiro a ser associado a este local, é um facto. No entanto, foi no continente americano, nos Estados Unidos do Brasil na cidade do Rio de Janeiro que Faustino Moreira Coelho nasceu. O registo de batismo indica que foi ungido com os sagrados óleos a 6 de janeiro do ano de 1858 na Igreja da Candelária, tendo nascido a 31 de novembro de 1857, um erro do pároco uma vez que o mês de novembro tem apenas trinta dias. É bastante provável, atendendo ao tempo de gestação normal, que tenha sido concebido em Portugal, uma vez que o pedido de passaporte do seu pai data de maio desse ano, pelo que sua mãe terá embarcado grávida.

Faustino Moreira Coelho foi o segundo filho do casal Manuel Coelho Moreira e Josefina Rodrigues Barbosa Cruz, que tinham já um filho, Alberto Moreira Coelho, cerca de dois anos mais velho. A par de tantos outros que partiam do seu país este casal procurou novas oportunidades de vida e acumular fortuna do outro lado do Atlântico. Sabemos por referências documentais que outros familiares destes também se deslocaram para o Brasil, no entanto, se antes ou depois destes é um detalhe que não conseguimos precisar. Será também no Rio de Janeiro, onde se instalaram, que nascerá em 1859 a terceira filha de nome Amélia Coelho Moreira. A aventura durou pouco tempo e teve um triste desfecho porque, ainda muito jovem, a 29 de abril de 1860, faleceu Josefina Cruz deixando o marido a braços com três crianças. Apesar deste acontecimento Manuel Coelho Moreira contraiu novamente matrimónio com Maria Angélica Barbosa Cruz, irmã da primeira mulher, com quem teve pelo menos mais oito filhos.

Muito provavelmente Faustino terá voltado com o seu pai para Portugal que, pelo menos em 23 de agosto de 1863, data do segundo casamento, já se encontrava novamente a residir no lugar das Fontainhas em Gandra. Tal hipótese ganha mais força quando vemos que os seus dois irmãos do primeiro casamento aparecem como padrinhos dos seus irmãos provenientes das segundas núpcias, pelo que sugere que tal como estes terá regressado. A sua passagem pelo Brasil terá sido curta, no entanto denotamos nos registos paroquiais uma mudança nas atribuições feitas a seu pai possivelmente decorrente da melhoria da sua condição económica. Inicialmente aparece como lavrador, depois como proprietário e capitalista e, após a mercê da comenda de Cristo atribuída por D. Luís em 11 de agosto 1811, é referido como o ilustríssimo comendador Manuel Coelho Moreira.

Sobre Faustino sabemos que se casou a 7 de novembro de 1889 na Igreja de Santo Tirso com Alexandrina Adelaide Correa Guimarães. Ela, natural de Santo Tirso, com 22 anos era filha de José Correia da Silva e Rosa Feliciana da Cunha, também eles naturais do dito concelho. Não sabemos o porque da escolha ou quando decorreu a radicação do casal na freguesia de Rebordosa, possivelmente pouso depois do casamento, sendo que no assento de casamento é dado como proprietário e lavrador a morar nas Fontainhas em Gandra e aquando do batismo de Alexandrina, afilhada e sobrinha de ambos, em 16 de setembro de 1896, o casal é referido como sendo já morador em Rebordosa.

Teve um percurso político na edilidade local como vereador por mais que uma vez. Foi vereador durante a presidência de José Martins da Costa de 2 de janeiro de 1882 a 2 de janeiro de 1984, sendo que, a título de curiosidade, o texto da ata de tomada de posse, embora assinada por Faustino, vem, erradamente, com o nome do seu irmão Alberto como tendo sido eleito para vereador. Permaneceu na posição nos dois anos seguintes, embora agora sob a presidência de José Martins da Costa Moreira e não de João José de Sousa Machado. Esteve também na vereação durante a comissão municipal que durou dois meses presidida por Francisco de Lemos Peixoto iniciada a 12 de outubro de 1898 à qual se seguiu um mandado presidido pelo mesmo de 12 de dezembro de 1898 a 10 de novembro de 1900. O último mandato onde Faustino assumiu funções de vereador na Câmara Municipal de Paredes foi o da comissão municipal presidida por Francisco de Lemos Peixoto que durou de 2 janeiro de 1905 até 23 de março do mesmo ano. A passagem pelas lides políticas, mais concretamente na governação municipal, não era estranha à sua família. Já o seu ascendente José Coelho Moreira tinha sido vereador. Também não findou nele esta ligação familiar à política uma vez que José Joaquim Coelho Moreira, seu sobrinho, também foi vereador municipal.

O ano de 1900 ficou marcado pela atribuição do título de Visconde de Rebordosa a Faustino Coelho Moreira. A carta de título outorgada por D. Carlos I data do primeiro dia de março desse ano, ainda que o decreto seja de 16 de novembro do ano anterior. Não importa agora aprofundar muito o documento em questão ou as condições da sua conceção, ainda que seja sabido que a conceção de tais títulos foi vista pela coroa como uma fonte de arrecadação de receita, daí que só fosse ratificada a carta após o pagamento das taxas e emolumentos, e, neste caso, a conta ascendeu a um conto e seiscentos e sessenta mil réis. Nesse mesmo ano faleceu o seu pai. O comendador José Coelho Moreira morreu a 11 de abril de 1900, tendo feito testamento a 18 de novembro de 1898, quando já se encontrava com uma saúde débil e acamado. O documento, embora um pouco insipido, revela a preocupação que recaiu sobre os filhos do primeiro casamento legando-lhes a terça parte deixando os restantes dois terços em partes iguais por todos os seus filhos.

Sobre a vida do Visconde de Rebordosa recai uma enorme penumbra de desconhecimento. Para além de alguns registos paroquiais onde ele ou sua mulher aparecem como padrinhos dos recém batizados ou documentos avulsos e pouco esclarecedores sobre o seu percurso não existem muitos mais dados que sejam conhecidos. Sabemos que se habitava no lugar de Aboim e qual era a sua casa que ainda hoje existe embora muito desfigurada.

Não teve descendência pelo que os principais beneficiários da sua herança foram os seus sobrinhos com especial pendor para os afilhados e para os sobrinhos provenientes de sua irmã Amélia e os da sua falecida irmã Maria Madalena, ainda que ressalvando sempre a posição da sua mulher no usufruto dos bens enquanto viva. O seu testamento, aprovado em 26 de março de 1927, é exemplificativo da sua situação económica desafogada. O visconde de Rebordosa possuía bastante património imobiliário na freguesia onde residia, assim como ações, obrigações e títulos, quer em Portugal quer no Brasil, onde parece ter mantido interesses. Nomeou para seu testamenteiro o sobrinho Amadeu Coelho Pereira, em segundo lugar José Maria Oliveira Campos e por fim José Pereira Mendes. Para os assuntos no Brasil foram nomeados António Alves do Vale, em segundo lugar o Dr. Aristides Lopes Vieira e Optaciano Alves do Vale.

Para além dos familiares deixou legados à Santa Casa da Misericórdia de Paredes ao “seu pároco da sua freguesia”, para ajudar na realização da festa das 40 horas, e ao padre que se encontrava à data na paróquia de Rebordosa. Curiosamente deixa um legado de 10 contos à Junta de Freguesia para a construção de uma nova igreja em Rebordosa se esta mudar para o lugar de Aboim ou para a sua proximidade num prazo de 3 anos a contar da sua morte.

Faustino Moreira Coelho viria a morrer no dia 21 do mês de outubro de 1927 no lugar de Aboim na freguesia de Rebordosa. Como referiu no seu testamento o Visconde de Rebordosa legou uma quantia para a construção de um jazigo no cemitério da freguesia de Rebordosa, que, embora não fosse a terra natal foi a terra que o acolheu e com a qual se identificava e onde ainda hoje repousa. Com a sua morte extinguiu-se o viscondado de Rebordosa ficando, no entanto, o seu legado na história local do concelho de Paredes marcando com a atribuição do seu nome na rua onde residia na freguesia de Rebordosa. Ainda que muito falte apurar sobre o seu percurso fica aqui mais um contributo no sentido de se promover o estudo de várias personalidades da história local.

 

Vasco Santos

 

Fontes e Bibliografia:

• Arquivo Distrital do Porto- Registo de batismo- PT-ADPRT-PRQ-PSTS22-001-0015

• Arquivo Distrital do Porto-Registo de casamento- PT-ADPRT-PRQ-PSTS22-002-0028

• Arquivo Municipal de Paredes, Atas Municipais, Livro 19

• Arquivo Municipal de Paredes, Atas Municipais, Livro 20

• Arquivo Municipal de Paredes, Atas Municipais, Livro 21

• Arquivo Municipal de Paredes, Livro de Registos de Testamentos, Testamento de José Coelho Moreira, Livro 42

• Arquivo Municipal de Paredes, Livro de Registos de Testamentos, Testamento de Faustino Coelho Moreira, Livro 94

• Arquivo Nacional da Torre do Tombo, Carta de Título. Visconde da Rebordosa- PT/TT/RGM/L/0014/263079

• Brasil, Rio de Janeiro, Registros da Igreja Católica, 1616-1980", , FamilySearch (https://www.familysearch.org/ark:/61903/1:1:6X8K-H3T8 : Tue Dec 12 13:38:10 UTC 2023), Entry for Faustino Caelho Moreira and Jose Caelho Moreira, 6 Jan 1858

• Coelho, Manuel Ferreira (coord.) (2014). Monografia de Rebordosa. Paredes. A Celer

• Costa, Cristiano Marques da Costa (coord.) (2017). Presidentes da Câmara Municipal de Paredes 1837-2017. Paredes: Câmara Municipal de Paredes.

• Sousa, Gomes de (2018). Visconde de Rebordosa. in O Paredense. Nº 74, pág.20

Top