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- Apontamentos da nossa história | 23 de Julho de 1832: O “ÚLTIMO DIA DA GUERRA” - (ao redor de Ponte Ferreira)
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Apontamentos da nossa história | 23 de Julho de 1832: O “ÚLTIMO DIA DA GUERRA” - (ao redor de Ponte Ferreira)



1. Prólogo
O presente trabalho, aparte as fontes bibliográficas referidas no final, baseou-se em testemunhos orais dos descentes dos intervenientes referidos durante o trabalho. Presente vivamente na memória das pessoas, embora sem fontes primárias constitui património imaterial deste território.
Para melhor se aferir sobre a realidade dos factos, foram contactadas diferentes pessoas, de famílias e lugares diferentes, todas acima dos 80 anos, em pleno uso das suas faculdades mentais.
A coincidência dos relatos, no que tange às pessoas, seus nomes e apenas, circunstâncias em que os factos relatados ocorreram e referências exactas à época em questão, não oferecem dúvidas quanto à veracidade dos mesmos. Aliás, as informações foram tão precisas e coincidentes, que facilitaram as buscas nos acervos dos registos centrais e paroquiais aquando das pesquisas sobre as datas de nascimento, batismo, casamento e óbitos dos intervenientes e seus ascendentes e descendentes.
Contudo, mantêm-se sempre uma certa exiguidade de fontes, sendo que, com os trabalhos que têm ultimamente sido levados a efeito e outros que futuramente possam surgir.
Daí que, estamos conscientes de que muito faltará, como em tudo, para termos uma visão pormenorizada de todos os acontecimentos ocorridos naquela altura.
Apesar de tudo isso, acreditamos que, rapidadamente, irão surgir contributos que permitam colmatar os hiatos que, no presente momento, existem em abundância.
Esperemos que assim aconteça rapidamente...!
2. Introdução
Quando as pessoas mais antigas de Moreiró, em Gandra, e as dos lugares do Vale, Ferreira, Lomba e Pinguela, em Sobrado, e as dos lugares do Calvário e de Terrafeita, em Campo, falam no “último dia da guerra”, estão a referir-se exactamente ao dia 23 de julho de 1832, quarta-feira, ou seja, à Batalha de Ponte Ferreira, cujo desfecho, apesar de ser dúbio, acabaria por decidir o futuro de Portugal, pese embora as muitas lutas e vicissitudes que ainda foram ocorrendo durante longos anos.
Cerca de um ano antes, entre 17 de abril e 8 de Agosto de 1831, D. Pedro desembarcara as suas tropas nos Açores e tomara diversas ilhas, estabelecendo a sua base de operações no arquipélago.
Conquistada a fortíssima posição militar e naval de Angra, nos Açores, por essa armada, D. Pedro partirá, depois, daí, para invadir o continente português, o que ocorrerá a norte do Porto, na Praia de Pampelido ou dos Ladrões, como era também conhecida, depois re-baptizada como Praia da Memória, naquilo que ficou conhecido como Desembarque do Mindelo do dia 8 de Julho de 1832, onde actualmente se encontra o grande monumento aos mortos da Guerra Civil, em forma de obelisco, colocado junto ao mar onde foi efetuado o desembarque.
As tropas pernoitaram em Pedras Rubras, um lugar da freguesia de Moreira, concelho da Maia, lugar esse que hoje também é freguesia e onde se situa também o aeroporto do Porto, dirigindo-se depois para o Porto. O local onde as tropas passaram as noites é hoje em dia ocupado pela feira de Pedras Rubras.
Este desembarque foi um dos acontecimentos mais importantes das Lutas Liberais, cujos participantes, organizados no exílio, nomeadamente em Inglaterra e depois nos Açores (onde as fileiras foram engrossadas por voluntários locais), eram comandados por oficiais ingleses, mas em que participaram o próprio príncipe e muitos homens que iriam marcar a vida portuguesa nas décadas seguintes, como Mouzinho de Albuquerque e Alexandre Herculano.
A acção que antecipou a Batalha de Ponte Ferreira inicou-se a 17 de julho, quando os dois exércitos se defrontaram em pequenos recontros nos montes circundantes ao lugar e nas ruas de Valongo. No dia 22 de julho o exército liberal recebeu ordens para atacar as forças miguelistas que se encontravam instaladas numa linha de batalha sobre montes situados adiante da povoação da Granja, na freguesia de Gandra, do outro lado do rio Ferreira, já no concelho de Paredes.
As tropas miguelistas estavam posicionadas numa extensa formação que se estendia até "Chão de Terronhas", actual lugar de Terronhas, freguesia de Recarei, concelho de Paredes. O extremo direito da linha chegava à margem esquerda do rio Ferreira, em Balselhas, freguesia de Campo e, do outro lado do rio, estendia-se até aos montes limítrofes que iam até ao ribeiro, ao fundo do Lugar do Vale, em Sobrado, montes estes repletos de trincheiras.
Na manhã do dia 23 de julho foi dada ordem para o exército liberal transpor a Ponte Ferreira. Durante mais de doze horas, liberais e miguelistas bateram-se em torno da Ponte Ferreira, sem uma vantagem clara e definitiva de qualquer das partes.
Contudo, as escaramuças nos dias que antecederam o dia da Batalha de Ponte Ferreira atingiam directa e indirectamente as populações locais, que tudo faziam para não se envolver, mas que nem sempre conseguiam evitar.
Uma das situações mais flagrantes era, quando confrontadas com algum grupo de soldados, serem questionadas da seguinte forma:
- Por quem Vivas?
Ou seja, “por quem dás vivas?” Por quem és? Por D. Pedro ou por D. Miguel?
Muitas vezes, sem saber o que responder, até porque não distinguiam as fardas militares, as pessoas não davam a resposta desejada e eram castigadas ou mortas. Daí um medo sempre latente quando se aproximavam grupos dispersos de soldados.
Por outro lado, a fome grassava e os lavradores dos lugares de Ferreira e da Costa, em Sobrado, bem como os de Moreiró, em Gandra, levavam o gado (bois, vacas, cabras e ovelhas) para os montes, para evitar que os animais fossem roubados ou mortos pelos soldados que, cheios de fome, deambulavam pelas aldeias a pedir de comer. Um dos locais predilectos para esconder o gado era no Recoste, um enclave arável entre os montes que separam Sobrado, Rebordosa e Gandra, hoje quase invadido pela passagem da A41 e pela expansão da Quinta das Arcas naquela zona.
3. Soldados e aldeãos
Maria Pereira de Queirós, conhecida como Ti’Maria “do Rocha”, era filha de João Caetano Pereira e de Maria José Queirós, neta paterna de Manuel Pereira e de Senhorinha Moreira, ambos de Gandra, e neta materna de Manuel José de Queirós, que era de Gandra, e de Antónia Ferreira, esta do Lugar e Freguesia de Sobrado .
Chamavam-lhe “do Rocha” por ter ido viver para a casa “dos do Rocha”, em Moreiró, depois de ter casado em 03-12-1818 com Bártholo Nogueira, filho de Manuel Ferreira e de Maria Nogueira, ambos casados em Gandra em 21-08-1877, se bem que a avó paterna do Bártholo, Ana Dias da Costa, fosse de Sobrado, mas que veio a casar com Martinho Ferreira, que era de Gandra. Os avós maternos do Bártholo, José Moreira e Ana Nogueira, eram ambos de Gandra.
Do casamento do Bártholo com a Ti’Maria “do Rocha” (Maria Queirós) nasceram dois filhos: A Justina Nogueira, nascida em Gandra em 03-10-1822 e a Fortunata, demente de nascença, nascida em 1826 .
Os soldados miguelistas já há muito tempo que circulavam por ali à volta, pressentindo a aproximação de um confronto final. Haviam construído trincheiras na encosta da Serra da Boavista que separa Sobrado, Gandra e Campo , nas cavadas do Portela, do Alves, do Vieira e dos Moutas, todos grandes lavradores do Lugar de Ferreira, em Sobrado, esperando as tropas de D. Pedro IV, de Portugal , que se aproximavam do lado de Valongo.
Com a ameaça de um confronto iminente, a Maria do Rocha achou por bem levar a sua filha deficiente para casa dos seus familiares em Sobrado, pois, no caso de terem que fugir da guerra, iria ser mais difícil a fuga se tivesse que olhar pelas duas filhas, para mais sendo uma delas mais limitada. Assim, depois de vários dias de adiamento, achou que não podia esperar mais, até porque as notícias da aproximação das tropas fiéis a D. Pedro fazia acreditar numa grande batalha para breve.
Já havia combinado isso com a família em Sobrado, quando tinha ido lá, cerca de um mês antes, às festas das Bugiadas, no dia de S. João. Embora gostasse muito de Gandra, orgulhava-se imenso das suas origens de Sobrado, por causa do bairrismo daquelas gentes. Com uma guerra em curso à sua volta e com um iminente conflito em grande escala, Sobrado não deixou de fazer a festa de S. João. Até ela, que passava a maior parte do tempo em Gandra, quando ouvia a Marcha do S. João de Sobrado começava logo a “dar ao pé”, apetecendo-lhe envergar uma farda de bugio e ir lá para o meio aos pulos.
Sabia que, embora as danças estivessem reservadas para os homens, havia mulheres que se cintavam e iam de bugio, escondendo o rosto atrás das máscaras. Como era absolutamente proibido tirar as máscaras aos bugios, havia uma certa segurança para essas mulheres mais resolutas. Mas sabia-se sempre quais eram as mulheres, devido às ancas mais roliças, ao peito mais saliente, apesar de cintado e aos pulos mais femininos. Até a sua filha Justina já lhe havia perguntado se podia ir de bugio. Acreditava que haveria um dia em que as mulheres pudessem ir de bugio sem restrições, podendo assumir tal situação e poderem tirar a máscara nos momentos certos sem serem importunadas.
Nesse dia, logo ao raiar do dia, pegou nas duas filhas pela mão e foi até casa dos seus familiares, em Sobrado, deixando lá a sua filha mais nova e regressando a casa com a filha Justina, que ia fazer dez anos daí a dois meses e pouco. Vinha um pouco apressada porque tinha demorado na conversa mais do que contava e já eram horas de fazer o comer para o marido que também tinha ido cedo para o campo e devia estar cheio de fome e a chegar a casa para o almoço.
Como sempre fazia quando ia a Sobrado, depois de sair de casa dos seus familiares desceu e seguiu através os campos em direção à Ponte do Martins , onde atravessou o rio Ferreira junto ao moinho daquela família, para apanhar mais à frente o caminho que vinha da Balsa em direção à Costa, passando pelo Lugar da Gandra. No fim da Costa, no Sítio da Presa , virou à esquerda pelo monte fora, indo sair à entrada de Moreiró, no estradão que ligava a nova igreja de Sobrado a Gandra.
Confiante num regresso pacífico a casa, ia bastante animada a contar histórias antigas à filha. Foi aí que os viu a aproximar-se. Calou-se, disfarçou e tentou esgueirar-se discretamente para não ser interpelada por um pequeno grupo de quatro soldados que deviam estar “em folga da guerra” .
Mas tal não aconteceu. Quando começou a acelerar o passo puxando com força a mão da sua filha, ouviu aquela voz autoritária, que lhe disse:
- Alto, aí...!
Gelou, sentiu um arrepio na espinha e parou. Tentou manter-se aparentemente calma, esperando o que vinha a seguir. Se fosse a pergunta do costume, já tinha uma resposta preparada. Podia ser que funcionasse. Temia por ela, mas, principalmente, temia pela filha que já estava a ficar uma mulherzinha, pois ouvia falar dos muitos abusos que os soldados cometiam. Manteve-se parada, sem olhar para trás, até que começou a ouvir o som das botas dos soldados que se aproximavam.
O som das botas parou e ouviu novamente a mesma voz que disse:
- Volta-te devagar, sem gestos suspeitos...!
Hesitou um segundo, que lhe pareceu ser o segundo mais longo da sua vida. Depois voltou-se e, olhando-o nos olhos, sorriu o melhor que pôde para o soldado que estava à sua frente, um pouco adiantado em relação aos colegas que tinham ficado um pouco mais trás...
4. Soldados e lavradores
Os quatros soldados tornaram-se amigos durante a guerra. Nunca pensaram em matar fosse quem fosse, mas agora viviam apressadamente e sem confiança no futuro. Nas terras deles eram pobres, mas tinham sempre que comer. Ali, entre trincheiras, há tempo demasiado para se lembrarem do primeiro dia, passaram imenso frio num inverno que se manteve chuvoso durante muito tempo. A vida nas trincheiras era dura, mas a fome dava cabo de tudo. E depois veio o Verão, com calor abrasador.
O que valia era que, de vez em quando, tinham as suas “folgas da guerra”. Como estavam no mesmo pelotão, começaram a esgueirar-se juntos, deambulando pelas aldeias das redondezas, tentando arranjar algo de diferente para se alimentarem e para mitigar aquela fome de tanto tempo que pareciam ter a barriga colada às costas. E, assim, entre os quatro foi crescendo uma amizade para além do companheirismo da guerra.
Aproveitavam também esses pequenos intervalos para lavar a roupa e dar uns mergulhos no ribeiro que passava naquele vale, junto a um moinho que os locais apelidavam de “moinho dos do Pinto de Ferreira”. Já não ligavam muito às mulheres que ali iam lavar as roupas, pois já as conheciam todas. Algumas delas até os ajudavam a lavar as suas roupas cobertas de lama das trincheiras.
Mais acima daquela local, já perto do engenho do Tomaza, havia o moinho do Catrino. Dizia uma lenda antiga que junto a este moinho havia sempre água corrente, mesmo no Verão mais escaldante, e tinha uma mina que levava água dali até ao Lugar de Ferreira, em Sobrado. Para baixo, havia também uma série de moinhos, sendo o último perto das Oliveiras dos Montes, próximo da ponte da Pinguela.
Naquela altura apanharam dois dias seguidos de “folga de guerra”. Era mau sinal... As notícias que lhes chegavam era que as tropas inimigas vinham a caminho dos lados do Porto e que um grande confronto estaria para breve.
Por outro lado, estavam animados por motivos diferentes. No dia anterior, haviam passado em Moreiró, em frente à casa do Sr. Tomaza, um lavrador local de muito bom coração. Quando ali passaram, sentiram no ar um cheirinho a caldo caseiro que fez com que as suas barrigas esfomeadas dessem sinal de imediato. Então, decidiram ir no dia seguinte até lá para tentarem a sua sorte.
O Tomaza era um lavrador remediado, de bom coração, que tinha alguns terrenos no vale, junto ao ribeiro, incluindo um engenho. Mais tarde, vendeu tudo ao Ti’Zé do Silva, de Moreiró .
Naquele dia, de manhã cedo, enquanto estava a ajeitar as cortes do gado, os quatro soldados bateram à porta do Tomaza. A surpresa foi grande quando o pacato homem foi abrir a porta e deu de caras com os soldados, o que não era normal.
- O que desejam? – perguntou com voz forte, com um ligeiro toque de irritação.
- Desculpe, não queremos fazer mal. Só queríamos perguntar se poderia arranjar-nos um pouco daquela sopa que fez ontem...! – disse um, com voz humilde.
E então contaram-lhe sobre a fome que passavam nas trincheiras e sobre o cheirinho que sentiram quando ali passaram no dia anterior.
O Tomaza, como bom coração que era, sentiu-se com pena e comovido. Então, respondeu:
- Passai aqui lá para as onze e meia que eu vou tentar arranjar-vos qualquer coisa para comer!
- Muito obrigado e até logo...!
E lá partiram eles, todos satisfeitos da vida com a promessa de uma boa sopa de lavrador.
Deram as voltas que deviam dar, vieram até junto dos colegas que estavam junto do ribeiro, perto do moinho dos do Pinto, a quem contaram a proeza de terem arranjado comida e, pouco depois das onze da manhã, lá partiram novamente em direção à casa do Tomaza, em Moreiró, para irem buscar a prometida comida, passando pelo engenho do Tomaza, lá ao fundo.
Quando chegaram ao estradão que vinha de Sobrado para Gandra, um pouco antes do regato que vinha da Presa das Hortas em direção ao ribeiro principal no vale , viram uma senhora com uma menina pela mão, com um comportamento suspeito e modos comprometidos.
Então um deles, que parecia o que comandava o grupo, disse bem alto e em tom autoritário:
- Alto, aí...!
A senhora parou, meia hesitante, mas não se voltou. Então, ele andou mais um pouco e disse-lhe:
- Volta-te devagar, sem gestos suspeitos...!
A senhora hesitou novamente, mas, entretanto, voltou-se, mostrando um sorriso que não era de esperar naquele momento e naquelas circunstâncias.
O soldado fez-lhe a pergunta da praxe:
- Ó mulher, por quem Vivas?
E a Ti’Maria do Rocha, pois era ela de quem se tratava, respondeu no meio de uma gargalhada:
- Bibo aos “c*lhões” do meu home, que são a alegria da minha bida...!
E todos os soldados, depois de um breve silêncio causado pela surpresa, desataram à gargalhada, devido à resposta tão pronta como desconcertante, dizendo-lhe que podia seguir em paz.
Como seguiam na mesma direção, os soldados acabaram por acompanhá-la até perto da casa dela, que era logo ali adiante, onde a Ti’Maria do Rocha entrou com a filha Justina, despedindo-se dos alegres e simpáticos soldados com um sorriso e um tímido “obrigada!”, os quais ficaram em amena cavaqueira à porta da casa do Tomaza, enquanto aguardavam pela comida prometida.
Quando a porta abriu, tiveram a boa surpresa: O Tomaza tinha-lhes preparado um caldo caseiro, com batatas, couves, cenouras e feijões, numa grande panela preta de três pernas, com um grande naco de carne de porco dentro e que libertava um cheirinho igual ao do dia anterior, entregando-lhes, também, um pedaço de brôa caseira embrulhado num pano de cozinha.
Então, eles arranjaram uma vara resistente, enfiaram-na na asa da panela e, todos contentes e revesando-se, lá trouxeram ao ombro a panela do caldo até junto dos outros colegas que tinham ficado junto ao ribeiro, perto do moinho dos do Pinto.
Não chegaram a provar a sopa. Tão depressa chegaram, tão depressa soaram as cornetas a convocar todos para a batalha, que ficaria conhecida para a história como A Batalha de Ponte Ferreira... e, para os locais, como “O Último Dia da Guerra”.
(continua)
Manuel J. F. Pinto (*)
Bibliografia:
- Moreira, Paulo Caetano: “A Batalha de Ponte Ferreira (Campo, Valongo, 1832): um processo memorialista e de valorização patrimonial”, 2012;
2012
- Luz Soriano, “História do Cerco do Porto”;
- “Os Combates da Formiga”, em
http://www.avozdeermesinde.com/noticia.asp?idEdicao=105&id=3370&idSeccao=911&Action=noticia ;
- Wikipédia: https://pt.wikipedia.org/wiki/Batalha_de_Ponte_Ferreira ;
- Infopédia: “Guerra Civil em Portugal (1832-1834)”.